Aqui para nós, a escola é um mal necessário que os alunos contestam por todos os lados.
Dentro desse aglomerado de salas , passam-se coisas dignas de se contar.
Antigamente, no tempo da minha avozinha, até havia uma régua grossa e os meninos andavam separados das meninas por turmas. Para não falar já naquela bata ridícula que eram obrigados a usar.
Hoje é um bocadinho diferente: existe maior compreensão da parte dos professores e dos alunos. Já não é preciso a batinha e anda tudo misturado.
Hoje é assim...
O toque da entrada já lá vai e o professor já está sentado, mas falta metade da turma; o segundo toque vem aí e, com ele, a outra metade da turma:
- Stor, posso entrar?
A aula começa e o professor pede para abrir o livro na página quarenta e cinco. Metade da turma não tem livro, mas, apesar disso, o António vai tentar ler, com mais uns cinco em cima dele. É a inflação dos livros...
No silêncio da leitura, ouve-se a voz do Carlos a perguntar que horas são, ao Aíta! O professor faz uma cara de irritado e diz-lhe que vá já, se está com muita pressa, mas com falta, claro! O Carlos, como é evidente, cala-se e dá um sorrisinho sem graça.
A aula continua a desenrolar-se quando é avistado um “aeroplano” de papel a sobrevoar a turma, desde o fundo da sala. O professor, mais uma vez irritado, pergunta quem é que fez o avião. Ninguém se acusa. Apesar das risotas e das insinuações dos da frente, não há outro remédio senão continuar a dar matéria.
Mais adiante, é novamente interrompida a aula.
O que foi desta vez? Não se sabe. Só se vê o Vítor e o Russo, vermelhões, escondendo a cara no livro. Por fim, o professor, sempre irritado, ameaça-nos de, para a próxima, irmos todos para a rua.
Mas eis que o toque da saída atrapalha o raspanete e eis também que ninguém mais ouve nada, todos se levantam, gritam, batendo nas mesas com os livros, arrastando mesas e cadeiras.
Assim acaba a aula, já sem ninguém na sala.
O professor fica perplexo. Foi mais uma aula em que ninguém ficou a saber “como é a raiz quadrada das invasões napoleónicas, na lei de Lavoisier com o auxiliar do verbo parler, junto à cadeia alimentar ou à espiral das ilhas dos Açores”...
No recreio, sim, talvez esteja a única coisa que aprendemos bem: a conviver.
Todos fumam ou comem, cravando cinco ou dez escudos ao parceiro. Aí, sim, fazem-se amizades e dezamizades. Todos se abraçam e riem, ao serem criticados pelos vizinho que moram mesmo ali muito perto, neste convívio em que se discute tudo, desde o primeiro namorado da Isabel ao último disco dos Rolling Stones.
Por isso, viva o recreio!
Ana Paula, aluna do oitavo ano do Externato de Odivelas, 1981/82
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