10 de setembro de 2004

As Escolas do Paraíso: Para que servem os professores?

César de Sousa

Um distinto membro da classe docente do ensino secundário garantia-me, há poucos dias, que os professores, nos ensinos básico e secundário, e muito em especial os directores de turma, não servem só para dar aulas. Têm, por exemplo, de organizar turmas e de fazer as matrículas dos futuros alunos para o ano seguinte. A questão surgiu porque a pessoa em questão mostrava-se preocupada por causa da influência dessas tarefas no usufruto das suas férias. E a secretaria, perguntei, não pode assegurar esse trabalho? Não, respondeu-me, porque não tem tempo.
A argumentação, é forçoso reconhecê-lo, evoluiu. A mesma pessoa dava-me, há tempos, argumentos relacionados com factores pedagógicos e característicos da própria organização escolar, para justificar, pelo menos, essas duas tarefas: receber as matrículas feitas pelos alunos e/ou pelos seus pais e/ou encarregados de educação na própria escola e organizar as turmas em que os professores são, mais do que os alunos, parte interessada por causa das suas agendas.

Esta actividade dos professores tem, é claro, uma explicação histórica: ela faz parte do exercício do que se designou por gestão democrática, que pôs os professores, fossm quais fossm a sua preparação e a sua disposição para a função, a dirigir as escolas por eleição. Foi uma das reviravoltas do 25 de Abril, uma consequência lógica do fim do exercício ditatorial dos directores das escolas.

Há poucos anos, começou a evoluir-se, não sem polémica, para uma mitigada profissionalização da gestão escolar, ao exigir-se aos professores que querem ser gestores alguma preparação na matéria. Supõe-se que, como tudo em Portugal, o êxito há-de ter sido tão limitado como discreto. Sabe-se é que a profissionalização, “latu sensu”, não chegou ao resto: os professores tratam de umas coisas, o pessoal administrativo trata de outras.

O Estado, nisto tudo, desempenha um papel equívoco de “laissez faire, laissez passer”, seja lá qual for a cor do partido do governo e/ou do(s) sindicato(s) que lhe faz(em) frente: como não quer e não pode pagar mais aos professores, deixa-os, normalmente, em paz. Mais férias, menos tempo nas escolas (além disso, garantir gabinetes e outras áreas de trabalho é mais caro), alguma autonomia, a convicção (que agrada aos sindicatos, que também dela lançam mão como bandeira para aterrorizar ministros) de que a gestão democrática ainda funciona. Ou seja: de que os professores é que mandam. É evidente que não advém mal ao mundo desta ilusão e destas actividades extra-curriculares dos professores. Mas há, nisto tudo, uma perversão feita de falsos poderes, de falsas obrigações, de pedagogia nacional-porreirista, de comodismo de um aparelho de Estado que não é, não deixa de ser e não consegue ser ou fazer que seja.

Quanto aos professores, bem... na melhor das hipóteses, fica a ilusão de que estão a ser úteis aos meninos e às meninas. Bem hajam, que deles será o Reino dos Céus...

A resposta está aqui. (13 de Julho)

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