O escritor que ousou chamar “Os Putos” à sua obra foi Altino do Tojal. A obra consta de uma série de histórias em que os heróis são os tais miúdos. Sobrevivem à custa de uma inocência ainda intocada e guardada, sabe-se lá porquê. O primeiro título foi “Sardinhas e Lua” e a primeira publicação em 1964, em Braga, terra natal do autor.
O menino dessa história, que deu o nome à primeira publicação, leva os dias sentado na soleira da porta, sozinho, à espera que a mãe chegue, de canastra vazia, ou quase vazia. Há sempre a “sadinha” que sobrou para ele para o filho, para a sua “jóia”, como ela lhe chama, carinhosamente.
Depois, é só o tempo de confeccionar a “sadinha” e começam a chegar os homens grandes. Há medo nestas linhas. Há incompreensão. Mas há a ternura imensa do menino que escolhe a Lua, para companhia do seu jantar. O cão e o gato são hóspedes habituais, com quem tem mesmo que partilhar o seu magro jantar. Eles, como ele, também têm a fome escavada nas caras. O cão e o gato também são muito pobres. A Lua, não. A Lua é “branca e gorda”, tem “as faces cheias”, “devia comer muitas sardinhas”... Ela recusava sempre e até parecia que a ouvia dizer: “Tome tu, menino.”
Acabado o jantar, ali ficava na soleira da porta, a conversar com a Lua. Até quase se esquecia dos homens grandes. Até a mãe o vir buscar, para dormir. Ele olhava então para a Lua, despedia-se dela e esperava que ela percebesse aquele triunfo. Ele, o homem pequenino, é que ia dormir com a mãe.
Sem comentários:
Enviar um comentário