10 de junho de 2005

Somewhere over the rainbow

A ideia de que os sonhos têm um tempo e um espaço para se tornarem realidade mora, às vezes quase clandestinamente, dentro de todos nós. A voz de Judy Garland imortalizou essa ideia, cantando-a. “Somewhere over the rainbow skies are blue… And the dreams that you dare to dream really do come true.” A ousadia é sonhar!
Judy era então a pequena Dorothy num filme feito todo de magia, tal como esses sonhos: homens de lata, velhinhas que fazem o seu tricot sentadas numa nuvem, cães maravilha como Toto, uma estrada de tijolos amarelos, o céu azul e o arco-íris da cantiga. E um feiticeiro que transforma qualquer desejo em realidade, o Feiticeiro de Oz. Foi um sucesso, tornou-se um clássico. O New York Daily News, reconheceu de imediato o valor de Judy como actriz e cantora, cuja voz era emocionalmente perfeita para esta magia...
Judy tinha apenas dezassete anos (dezasseis quando rodou o filme) e apaixonou o mundo com a sua voz. Ganhou o Prémio da Academia pela melhor interpretação juvenil. Decorria o ano de 1939 e o mundo precisava de fantasia, pois eclodia a Segunda Guerra Mundial.
Segundo alguns biógrafos, Judy foi a primeira actriz a ter consciência do papel encorajador junto dos soldados e a fazê-lo espontaneamente, mesmo quando o tempo disponível era pouco
Frances Ethel Gumm nasceu a 10 de Junho de 1922, no estado de Minnesota. Terceira filha de dois actores de vaudeville (corruptela do francês "voix de ville", canção parisiense do século XVI),.Frank e Ethel inspiraram-se nos seus nomes para baptizarem a filha que tratavam por Baby ou Frank Jr, porque de facto eles desejariam que Judy tivesse nascido rapaz... De Frank terá Judy herdado o talento de cantar.
A primeira infância foi um período feliz, com uma mãe carinhosa, cuja prioridade era a família, apesar de alguns verem na figura materna apenas o lado empresarial, papel que lhe coube de facto. Tanto o pai como a mãe tentaram transmitir às filhas o gosto pela música e pela arte de entreter. Aos dois anos e meio (dizem) terá feito a sua primeira aparição, num espectáculo de Natal, cantando “Jingle Bells”, incluída numa actuação dos pais.
Dois anos mais tarde, a família mudava-se para a Califórnia, Lancaster, onde Judy e as irmãs cantavam em teatros, clubes e na rádio. Ao pai, Frank Gumm, não seria concedido assistir ao sucesso da filha, pois poucas semanas depois de Judy ter assinado um contrato de sete anos com a poderosa fábrica de estrelas MGM, Frank morreu subitamente, vítima de meningite. Este foi o pior acontecimento da sua vida... A infância feliz tinha chegado ao fim. As três irmãs já tinham mudado o apelido para Garland, por sugestão alheia e razões artísticas, tendo Baby Gumm escolhido Judy para seu primeiro nome.
Judy Garland, para sempre.
Entre os momentos importantes deste princípio de carreira, conta-se a festa de aniversário de Clark Gable, onde Judy cantou, em nome de todas as meninas americanas apaixonadas pelo ídolo, uma versão emocionada de “You made me love you”. Dias depois começaram a surgir pequenos papéis no cinema. E não tardaria a aparecer então o papel que a tornaria para sempre uma das estrelas mais brilhantes desse universo da fama, Dorothy, O Feiticeiro de Oz. Judy tinha apenas dezasseis anos, muito verdadeiros de inocência e naturalidade. Ela era “doce e adorável”, como recorda o actor que interpretou o Homem Lata. “Não era como algumas (actrizes) de dezasseis anos que representam como se tivessem sessenta...”, acrescentava.
Mas quando se recorda Judy Garland não se consegue evitar a lembrança de uma mulher emocionalmente instável, que casou cinco vezes, uma das quais com um nome grande da tela: o realizador Vicent Minelli, por quem se apaixonou durante a rodagem de um outro musical, em 1944, “Meet me in St Louis”. Era o seu segundo casamento e apesar do nascimento da filha Liza, apesar da dedicação de Vincent, o casamento chegava ao fim no início dos anos cinquenta. A inquietação de Judy é normalmente atribuída à medicação que lhe tinha sido prescrita para controlar o peso, que terá acabado por lhe arrasar os nervos, dormindo à custa de uns medicamentos e acordando à custa de outros...
Remando contra a adversidade que já integrava a sua personalidade, tal como a voz e o talento, Judy voltaria a brilhar nos néons de Hollywood: “A Star is born” é outro dos inesquecíveis trabalhos de Judy no cinema, que lhe valeu uma nomeação para o Óscar de Melhor Actriz, em 1955. Estava então casada com Sidney Luft, pai de Lorna e Joseph, seu único filho rapaz. A vida artística continuou, mas este casamento terminou, tendo sido o mais longo dos cinco.
Conta-se ainda entre os momentos altos da vida da “menina pequena de voz grande”, mais uma pobre menina rica, a nomeação para um outro Óscar da Academia, na categoria de actriz secundária, pela sua interpretação no filme “O julgamento de Nuruemberg”, em 1961.
A 22 de Junho de 1969, Judy sucumbiu a uma overdose de barbitúricos, ocasional, segundo os familiares. Tinha quarenta sete anos vividos ao dia, à hora, ao minuto, provavelmente. Quarenta e quatro desses anos foram de trabalho. Parece terem sido todos consumidos na busca da paz interior que não conseguia encontrar.
Judy inspirou uma rosa, amarela matizada de laranja avermelhado, que tem o seu nome e é cultivada nos jardins da Casa Museu. Bela homenagem, plena de simbolismo: a beleza nunca perdida, a tranquilidade jamais encontrada.
Judy e a eterna canção vivem, certamente, num céu azul, para lá do arco-íris...
(Publicado pela Editora Ela Por Ela, Divas do Cinema, em 2003)

2 comentários:

Mitsou disse...

Ainda não comprei mas vou comprar. Beijinho de parabéns, linda!

Dinamene disse...

Bonita recordação! Basta-me a invocação de «A star is born», Madalena. Mas «Meet me in St Louis tb me ficou, e outros, e fez-me ir a correr buscar o disco «Show Boat», a música de Jerome Kern.
Bjo para ti.